segunda-feira, 27 de abril de 2009

Eu, Eu mesmo e Meu eu

Hoje a santíssima trindade do meu ser resolver entrar em colapso. Eu, ainda bem perdido, encontrou com Eu mesmo, que imediatamente fez o favor de ligar para o Meu eu.

O contraponto entre Eu mesmo e Meu eu é nítido, mas é sempre assim: um não anda sem o outro.

Em contrapartida, Eu não se entende com ninguém. É sensato demais, é diferente. Ao lado de Eu mesmo e Meu eu aparenta ser a figura mais centrada, a força racional entre os três.

Eu mesmo, poxa, como descrever. Eu sou eu mesmo. Opa! Lá vem o Eu mesmo, tomando pra si todo o espaço, a atenção. Mas, em sua defesa digo que esse cara também é sempre aquele que se sente culpado por tudo... vai entender. Vai ver Eu mesmo prefira levar a culpa, só mesmo pra chamar a atenção. A cara dele.

Pra conhecer Meu eu, puxa vida, quase não dá pra explicar. E não porque seja difícil reconhecê-lo, mas exatamente porque Meu eu é tão inocente e ingênuo, que ainda não aprendeu a se proteger. Sonha acordado e, sem perceber, dorme chorando.

Ao unir tantas misturas, tantos eus, fica difícil arbitrar. Certo e errado deixam de existir, pois não é possível que uma regra tão meio a meio, com só dois resultados, possa ajudar os três.

Eu levantou confuso pela manhã. Este, sempre preocupado com as decisões que anda tomando (apesar de saber que não saiu da linha e seguiu os planos, determinado. Veja só: Eu até parou de fumar). Eu sabe que os caminhos que escolheu e escolhe a cada novo dia faz parte dos sonhos de Meu eu, e, se errar e desapontá-lo será uma dor terrível.

Obviamente, me vendo escrever estas letras, Eu mesmo quase se mata de tanto que se debate, perguntando-se: - Uai, mas porque você não conta o que eu fiz? Onde está minha parte neste sucesso?

Sim, Eu mesmo precisa aparecer. E na verdade, sem desmerecer ninguém, preciso dizer que Eu mesmo é a cola que une o trio. É a força que mantém o grupo motivado, é a luz do otimismo e o humor que alegra a si, aos outros dois e todo o resto.

E pra ele é assim mesmo. O resto é resto. Nada é mais invencível, mais verdadeiro. Respeita sim, pois só assim se é respeitado. Assim como Eu, Eu mesmo é determinado, seu único problema é que em muitas vezes, ele perde o controle. Pudera. É tanta alegria, tanta espiritualidade, que evidentemente, a razão perde espaço. Eu e Eu mesmo vivem nesse conflito. E há tempos não conseguem achar um denominador comum.

O resultado de tudo isso é que, Meu eu, pobrezinho, vive a observar a luta entre esses companheiros e, sem força, sem voz, pouco pode diante dos titãs. Meu eu pensa que Eu tem razão, pois o que ele quer é que Eu mesmo amadureça e pare de causar tantos transtornos. Mas Meu eu também entende que, se Eu mesmo se entregar totalmente, pouco ou quase nada mais fará sentido para ele.

É quando Meu eu chora. Chora como se visse seus dois amores se matando e, ao observar sua impotência, chora mais. Chora ao pensar que um dia, Eu, Eu mesmo e Meu eu já foram tão felizes juntos. Viviam em harmonia entre si. Nada parecia poder abalar os elos que os uniam. Eu achava o máximo a maneira de ser de Eu mesmo. Eu mesmo apoiava todos os planos de Eu, inclusive dava idéias de como Eu poderia chegar lá em perder o rebolado. Eu e Eu mesmo cuidavam de Meu eu, certamente o mais frágil, mas que na época sentia-se seguro com a atenção e amor dedicados pelos outros dois e seguia a cultivar e adubar seus sonhos.

Meu eu sempre quis ser como Eu mesmo. Eu também. Apesar de nunca admitir, Eu mesmo queria mesmo era ser Eu. Em seus momentos de fraqueza, quando dos excessos de euforia, sempre se comparava a Eu e a sua forma tão correta de agir em todas as ocasiões. De repente, acionava Meu eu e juntos, discursavam sobre a grande influência e admiração que tinham por Eu.

Por fim, Eu queria ser como Eu mesmo, mas também sentia falta de entender o que Meu eu tinha que o tornava uma parte tão misteriosa e especial. Sua maneira de compreender, dar apoio e de se emocionar faziam com que Eu pensasse sobre seu jeito, às vezes muito intolerante.

O fato é que hoje, a falta de equilíbrio entre Eu, Eu mesmo e Meu eu, fez com que Eu chorasse de desespero, Eu mesmo abrisse mão de tentar unir o trio com sua fonte de energia motivadora e Meu eu pensasse que seus sonhos não valiam mais a pena.

Os vizinhos sentem falta. Sempre disseram aos três que eram incríveis juntos, apesar de todos os seus defeitos (que Eu mesmo não nos ouça agora). Cartas, e-mails, convites, solicitações transbordam nas caixas de correio dos três. Um quer conselhos de Eu, mas ele não consegue mais ver clareza em ter objetivos, em planejar. Outro precisa de companhia para um samba, mas Eu mesmo não tem mais ânimo. E ainda tem sempre alguém precisando de um pouco da inspiração vinda de Meu eu, mas já não há.

Eis que no encontro que marcaram para esta noite, Eu resolveu tomar as rédeas da situação, “Afinal, que porra é essa que está acontecendo?”. Passional, Eu mesmo respondeu a altura “A merda toda Eu, é culpa sua cara”. Meu eu, perplexo, mas decidido a resolver logo essa pendenga, mandou “Olha aqui vocês dois, a coisa toda já está pra lá de ridícula. Mal me reconheço. E pior, mal reconheço vocês. Culpar alguém aqui é o que menos importa”. “Sábias palavras” pensou alto Eu. Eu mesmo, tipicamente com a cara fechada, preferiu ouvir.

Meu eu, aparentemente a peça mais frágil, continuou a tocar a situação, dizendo “A razão de Eu acordar todo dia é porque eu sonho com as coisas que só Eu mesmo pode concretizar. É simples assim. Ao passo que nossas virtudes nos complementam, nossas falhas nos unem ainda mais”.

Na cama, deitados, os três relembram seus grandes momentos. Todos choram. Eu, por tudo estar nos eixos novamente. Eu mesmo chora de alegria. Meu eu, de esperança.